segunda-feira, 27 de julho de 2015

"Desemprego de colarinho-branco" e o declínio do sonho americano

Simplesmente sensacional o livro "Desemprego de colarinho-branco: a inútil busca do sucesso profissional", escrito pela ensaísta/ jornalista/ feminista/ socialista Barbara Ehrenreich. Trata-se de uma crítica mordaz e avassaladora tanto da ilusão do sonho americano de que o sucesso é consequência inevitável do trabalho árduo, quanto da cultura individualista do "pensamento positivo" disseminada por terapeutas, gurus e coaches de todo tipo, segundo a qual para conseguir o que se quer basta acreditar e pensar positivo (e caso não consiga, lembre-se: a culpa é exclusivamente sua). Ehrenreich, autora de inúmeros outros livros de critica social, já havia tratado do tema do pensamento positivo na sua memorável e demolidora obra "Sorria: como a promoção incansável do pensamento positivo enfraqueceu a América", publicada há pouco tempo no Brasil, só que desta vez seu foco é outro. 

Em "Desemprego de colarinho-branco", Ehrenreich finge, por cerca de um ano, ser uma profissional de Relações Públicas desempregada - ou melhor, "em transição" - e, portanto, em busca de algum emprego razoável em uma empresa razoável. Para conseguir tal objetivo, a autora se infiltra no mundo dos desempregados de colarinho-branco, ou seja, daqueles profissionais que possuíam bons salários, se dedicaram por anos a fio a uma empresa e, de uma hora para outra se viram desempregados (como afirma a autora, a lealdade cobrada dos funcionários, muitas vezes não é retribuída pela empresa). Para conhecer esse mundo, a autora se aventura pelo bizarro universo dos coaches, dos orientadores de carreira, dos gurus do pensamento positivo, dos pregadores da teologia da prosperidade e, no meio do caminho, conversa com dezenas de pessoas desempregadas que, a despeito de todo o sofrimento e dificuldade que passam por estarem sem emprego e endividadas, eram forçadas ou, pelo menos sugestionadas, a se manterem em contínuo estado de pensamento positivo, de "pró-atividade", "de atitude vitoriosa" e de "paixão" - caso queiram ser contratadas por alguma empresa, obviamente. 

A conclusão da autora, após uma complexa jornada pelo mundo corporativo, é desanimadora: o sonho americano não passa de um sonho. Como afirma na conclusão do livro, "se alguém pode dar um testemunho confiável do declínio do sonho americano, esse alguém é o colarinho-branco desempregado - as pessoas que 'seguiram as regras', fizeram 'tudo certinho' e, mesmo assim, terminaram arruinadas". Mas sua conclusão não é simplesmente pessimista. Segundo Ehrenreich, é imperativa a união dos desempregados norte-americanos em prol de lutas comuns como o aumento do seguro-desemprego, e a cobertura universal do seguro saúde. Segundo a autora, no genial último parágrafo do livro, é necessária 

"uma mudança psicológica, para dar o salto da solidão desesperada para a ação coletiva. Mas este não é o tipo de transformação imaginada pelos orientadores de carreira. Os desempregados e empregados intranquilos precisam não de 'simpatia', mas da capacidade real de estender a mão para os outros e envolvê-los em um projeto comum, que inclua,idealmente, outros muito diferentes, como os trabalhadores de baixa renda cronicamente estressados. Eles não precisam de uma 'atitude vitoriosa', mas de uma qualidade mais profunda e mais antiga, uma que nunca ouvi ser mencionada em minha procura por emprego, que é coragem: a coragem de se unir e lutar pela mudança, mesmo diante de uma avassaladora desvantagem".
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